Nível conglomerático em calcarenito do Toarciano, Cabo Carvoeiro, Peniche. Outubro de 2013, Ricardo Pimentel.
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Nau dos Corvos… o barco vai de saída
Nau dos Corvos – foto de Ricardo Pimentel
“…
Já tenho a vela enfunada
marrano sem vergonha
judeu sem coisa nem fronha
vou de viagem ai que largada
só vejo cores ai que alegria
só vejo piratas e tesouros
são pratas, são ouros,
são noites, são dias
Vou no espantoso trono das águas
vou no tremendo assopro dos ventos
vou por cima dos meus pensamentos
arrepia
arrepia
e arrepia sim senhor
que vida boa era a de Lisboa
O mar das águas ardendo
o delírio do céu
a fúria do barlavento
arreia a vela e vai marujo ao leme
vira o barco e cai marujo ao mar
vira o barco na curva da morte
e olha a minha sorte
e olha o meu azar
e depois do barco virado
grandes urros e gritos
na salvação dos aflitos
estala, mata, agarra, ai quem me ajuda
reza, implora, escapa, ai que pagode
rezam tremem heróis e eunucos
são mouros são turcos
são mouros acode!
Aquilo é uma tempestade medonha
aquilo vai p’ra lá do que é eterno
aquilo era o retrato do inferno
vai ao fundo
vai ao fundo
e vai ao fundo sim senhor…”
Fausto
Muros de pedra
Sempre que vou à minha terra gosto de andar por entre muros de pedra, de preferência sobre terra batida, mas já não há muitos como outrora, estão quase todos deitados abaixo ou, pior ainda, seguros a cimento. Sempre que posso vou ver os muros, que o meu Avô Fernando arranjava, estão abaulados, com pedaços caídos porque nunca mais lhes afagaram as pedras e as sobrepuseram com a paciência que só o tempo de antigamente permitia. Fico satisfeito de ninguém lhes ter mexido! Pelo menos, como adorno, apenas se vêem os líquenes cor-de-laranja em vez de argamassa cinzenta.
A pedra do muro da entrada, onde o meu bisavô Veríssimo se sentava, já lá não está. Infelizmente alguém, ignorando que aquela pedra virada a sul nos aquecia nos dias soalheiros de Inverno, arrancou-a enquanto alcatroavam a rua do Farol… maldito alcatrão que tomou conta de todos aqueles caminhos de pedra!
As bocas-de-lobo já floriram entre os calcários mas para mim serão sempre os coelhinhos. Era assim que me pareciam aquelas flores, além disso na casa da minha Avó Angelina havia coelhos e lobos nunca os vi! Bem espreito por cima do muro, para ver se vejo as ginjeiras, mas não consigo. Talvez ainda lá estejam junto ao muro oeste do casal, e a florir, em Junho encherão a barriga aos pássaros… pena eu não as poder comer como fazia nos intervalos dos momentos em que ia à figueira que nos dava figos pelo S. João.
Para minha alegria salvaram-se as silvas, que crescem contra os muros pelo lado de fora, ao menos isso, deixaram-me os espinhos! Das flores dos silvados já nasceu fruto, ainda vermelho e acre, mas vão amadurecer e no Verão que aí vem vou comer amoras nos meus passeios. Sim, sei que vou comê-las, porque ainda o Verão passado as comi… é que os meninos de agora preferem as gomas e já não colhem, com ar guloso, as amoras negras como eu fazia. E eu, enquanto galgo passos em direcção ao Cabo Carvoeiro, vou murmurando em surdina: Isso! Comam gomas! Quase que dá para ouvir a minha prima Gina, num som com quase quarenta anos, “Comeste amoras? Vou dizer ao teu pai que já namoras…”.
Campo de lapiás do Cabo Carvoeiro
Com a devida vénia aos autores da montagem. Serve para conhecerem um dos locais mais bonitos da costa portuguesa 🙂